dezembro 28, 2011

O sentido do Natal


A cada ano, milhões de pessoas ao redor do mundo se juntam na noite do dia 24 de dezembro para celebrar a ceia de Natal e trocar presentes. Mas qual o verdadeiro significado dessa data?

Tradicionalmente, o Natal é a celebração do nascimento de Jesus - ainda que sua data de nascimento exata seja desconhecida - de forma que, para entender o sentido do Natal, é necessário entender o significado do Cristo. E essa definição por si só já trouxe muitas guerras por séculos e séculos: para os cristãos, Jesus é Deus, o Messias anunciado nas escrituras judaicas; para os Judeus, ele é um inimigo de Deus, que levou as pessoas para longe de Seu propósito; para o Islã, ele é um profeta, mensageiro de Deus, Messias (mas não é Deus feito Homem, como para os cristãos). Essas três ideologias (e suas derivações) têm convivido por séculos, muitas vezes em conflitos, numa perigosa mistura de interesses políticos e ideológicos.

No centro dos ensinamentos de Jesus está a crença de que o reino de Deus pode ser alcançado pelo cultivo de duas práticas principais*: (i) amar a Deus sobre todas as coisas; e (ii) amar ao próximo como a si mesmo. Dentro do contexto budista, essas práticas podem ser interpretadas, respectivamente, como o cultivo da vacuidade do ego (sunyata/anatman) e da compaixão (metta/karuna): 'amar a Deus sobre todas as coisas' é abandonar o próprio ego, não sucumbir aos desejos e não agir egoisticamente, mas pensar primeiro no todo antes de olhar os detalhes; 'amar o próximo como a si mesmo' é entender que somos todos seres humanos, e todos temos nossos medos, sonhos, desejos, defeitos e qualidades. A combinação dessas duas práticas deve levar ao desenvolvimento de uma consciência maior que, em ultima instância, levaria ao reino de Deus** (ou, como dizemos no Budismo, ao estado de Nirvana).

Então, como celebração do nascimento de Jesus, o Natal deveria ser uma época para celebrar a compaixão e a vacuidade. Uma época para deixar o ego para trás e ir atrás daquela pessoa com quem não nos damos bem e dá-lo/a um grande abraço, um sorriso e nos desculparmos por algo de ruim que possamos ter feito. É um tempo para aceitar a ação dos outros, respeitar suas escolhas e seus pensamentos, ainda que sejam diferentes de nosso ponto de vista: deixar para trás o apego a nossas ideias de certo e errado é também parte da vacuidade do ego. O Natal é também um tempo para se passar com amigos e família, mesmo com aqueles parentes de quem não gostamos muito, ou as mesmas comidas e fofocas de fim de ano. Por mais cliché que possa ser, é o momento de se abrir para dar e receber amor, espalhar caridade, ouvir àquelas pessoas que precisam desabafar suas aflições, abraçar os que precisam de um pouco de carinho e alimentar aos que têm fome. Isso é compaixão. É disso que se faz o Espírito Natalino; muito mais do que uma mesa enorme e farta de comidas deliciosas e uma árvore cheia de presentes. Então, aproveitemos essa época para nos aprofundarmos em nossas práticas, tentando arrastar esse espírito de natal pelos outros 364 dias do ano.

Feliz Natal (atrasado)!!

Abaixo, umas fotos do meu Natal aqui em terras longínquas:

Entregamos cerca de 2000 presentes vindos de todo o Japão para crianças e adultos na área afetada pelo tsunami de março de 2011, na província de Iwate.

Servindo Oden (um tipo de sopa tradicional do Japão) para os moradores das casas temporárias que o governo providenciou para os que perderam suas moradias no terremoto e tsunami de março.



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* Claro, existem vários outros ensinamentos, mas os pontos centrais são, no meu ponto de vista, resumidos nessas duas práticas. Por mais simples que possa parecer à primeira vista, essas duas definições têm vários problemas filosóficos profundos, a começar pelas definições de Deus e 'próximo'. Líderes religiosos têm discutido esses significados há milênios...

** Existem várias linhas de pensamento sobre o que significa o Reino de Deus, como acontece com o Nirvana e a Terra Pura do buda Amida. Há aqueles que o vêem como um lugar real, para onde as boas almas vão após a morte; e, no outro extremo, os que o vêem como um estado mental, acontecendo aqui e agora. Meu voto vai para o segundo.

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